terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Outros poetas

Aqui está outro poeta. Quando lhe pedimos para ser príncipe, ele reclama porque quer ser cão!


Poeta especial

   De todos as meninas-poetas que eu conheço, esta é a mais especial.








Biblioteca
Onde está afinal a imaginação?
Procuro-a por todo o lado,
Mas não a encontro onde costuma estar,
Não a encontro em nenhum lugar.
Por vezes, pousa na minha mão,
Perto do meu coração,
Mas agora não.
Sobe às árvores,
Pendura-se num ramo,
Mas vem sempre quando eu a chamo.
Talvez, desta vez,
A tenha de procurar noutro lado,
Num sítio quase encantado
Onde, por trás de portas abertas,
Vejo um milhão de asas
Que espreitam e piscam os olhos.
Por isso leio, escrevo e devaneio
E encontro a minha imaginação,
Bem perto da minha cabeça,
Bem perto do meu pensamento,
Nessa grande casa dos livros,
Nesse moinho de vento.
                        Margarida Magalhães Vieira

sábado, 11 de dezembro de 2010

Preliminares de Natal

   Ainda não fiz a árvore de Natal. Este ano não me apetece. Faltam aqui os miúdos para dar graça a estes objectos inúteis que, ano após ano, revestem os ramos do pinheiro comprado nos trezentos. Se ao menos eu tivesse mais tempo para estas coisas,se ao menos tivesse quem as apreciasse...
   Hoje o Natal é tão diferente do que era. Lembro-me da lareira, do fumo, às vezes intenso, dos escanos onde nos sentávamos todos. Não me lembro muito da comida, só do cheiro a canela, da aletria e das rabanadas, mais nada! Lembro-me da certeza que naquele dia estávamos todos. Lembro-me de rir, de estar feliz, de gostar muito da minha família! Lembro-me de termos tempo para as pessoas. Como não tínhamos perdido tempo a comprar prendas, ficávamos com todo o tempo para estar uns com os outros. Lembro-me de deixarmos um sapato (ou bota) na chaminé e de, no dia seguinte, lá encontrar em cada um uma saca cheia de paciências, catraios e bolachas de baunilha. Acho que nunca acreditei que fosse o menino Jesus, como dizia a mãe. A maneira como a saca era fechada era igual aos embrulhos que o pai fazia na loja, por isso... mas não interessava. De manhã, ficávamos tão entusiasmados, assim, sem brinquedos, cheios de Natal. O primeiro que se lembrasse, dizia:
   - As minhas janeiras a todos!
   Depois diziam uns e outros, desordenados, nenhum queria ser o último a pedir porque os últimos não pediam, tinham de dar.
   Não tínhamos árvore de Natal e hoje tenho aqui figuras, bolas, estrelas, pais-natal, e uma infinidade de relíquias do presépio (Nossa Senhora, S. José, o Menino Jesus, os reis, a vaca, o jumento e os músicos da banda, em filinha...). Só me falta a vontade, falta-me essa magia, faltam-me os pequenos aqui!
  

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Sonambulismo

   - Vou fazer alguma coisa que preste. - Dito isso, deitou-se na cama e fundiu-se nos cobertores. Fechou os olhos.
   Pasmada, ainda meio tonta de sono, pensou que fosse outra vez o sonambulismo a falar. Acontecia de tempos a tempos. Já não era a primeira vez que assim, sem mais nem menos, se erguia de rompante na cama, afastando a roupa que o cobria como se afastasse um adversário incómodo que lhe aparecia à frente. Esbracejava, de olhos fechados, sempre de olhos fechados, e depois deitava-se. Mais de uma vez teve que lhe ajeitar os lençóis, contrariada, mal refeita da agressão, ainda dormia um sono alto quando isto se dava.
   Mal acordada, habituada, preparava-se para lhe compor os lençóis, como sempre fazia. Procurou-os com as mãos, sem os olhos, semicerrados de sono. Não os encontrando, abriu-os contrariada.
   - Ora bolas - olhou-o já com os olhos livres - acorda-me, desabriga-me dos cobertores e ele ali, no quentinho, com eles. Maldito sonambulismo!
    Deitou-se, puxou a roupa com força, obrigando-o a partilhá-la com ela, virou-se e tentou dormir. Mas o sono já lá ia, afastado pela raiva momentânea. Suspirou com violência. Fechou os olhos.
   Ele, sempre quieto, sorriu, virado para o outro lado da cama. Abriu os olhos.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Contrariedades

   É preciso muita coragem para enfrentar aqueles de quem gostamos, há sempre um lado que quer fazê-lo e outro que tem demasiado medo de perder a rotina afectiva que se impôs. Temos sonhos, queremos vivê-los antes dos trinta, quarenta, cinquenta, o tempo passa e continuamos no mesmo lugar, como um burro teimoso que nenhuma promessa arranca dali. Queremos obrigá-lo a mexer-se, um pouco que seja, e ele continua firme. Enfiamos o desejo numa gaveta e esquecêmo-lo lá, junto às chaves sobressalentes do carro que já nem lembramos que temos. Um dia havemos de precisar delas...

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

De novo Eugénio...


O amor
é uma ave a tremer
nas mãos de uma criança.
Serve-se de palavras
por ignorar
que as manhãs mais limpas
não têm voz.

                     Eugénio de Andrade